Programa desta sexta (17) retrata algumas das principais doenças que afetam a saúde ocular do brasileiro e fala da importância do acompanhamento médico e prevenção.
O Globo Repórter desta sexta-feira (17) falou sobre a saúde dos olhos e os tratamentos mais modernos contra as doenças da visão, como o glaucoma, miopia, ceratocone e retinoblastoma.
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2050 metade da população vai ter miopia e o uso de eletrônicos pode ser uma das causas. O programa conheceu os desafios e as histórias de quem enfrenta problemas oculares:
Glaucoma, um motivo de preocupação
Com 33 anos, Gustavo Dini foi diagnosticado com glaucoma, uma doença silenciosa que provoca a perda da visão periférica ou central gradualmente. Como a doença se manifesta predominantemente entre os mais velhos, os médicos demoraram para identificar a doença, que só foi percebida por especialista em Juiz de Fora (MG), cidade que se tornou um destino para quem busca alternativa para o tratamento.
“Eu nem sabia que existia essa doença, não sabia que a pressão do olho era uma e a pressão arterial era outra”, diz.
A doença é a principal causa de perda irreversível da visão e atinge 64 milhões de pessoas no mundo. Ela começa com uma obstrução dos canais de drenagem do olho e provoca o aumento da pressão ocular e danos no nervo óptico.
Uma técnica nova utiliza um stent que dilata o canal e facilita a drenagem do líquido do olho, diminuindo a pressão. E o Globo Repórter acompanhou a cirurgia feita no Gustavo, que conta com o menor dispositivo médico a ser implantado no corpo humano.
“A ideia do stent já era muito antiga, mas não se conseguia produzir um desse tamanho, que precisa ser colocado dentro do olho do paciente”, explica o médico.
Ricardo Augusto Paletta Guedes é presidente da Sociedade Brasileira de Oftalmologia e está trabalhando para que, além dos planos de saúde, o Sistema Único de Saúde (SUS) também ofereça a cirurgia com stents, complementando o arsenal de tratamentos que inclui procedimentos com laser e colírios.
A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS recomendou o uso, o Ministério da Saúde acolheu e agora só falta o treinamento das equipes e compra do material.
Uso excessivo de eletrônicos
Uma rede de hospitais oftalmológicos de São Paulo observou um aumento de 33% nos casos de miopia entre adolescentes de 11 a 17 anos no ano de 2023. Para especialistas, fatores ambientais podem contribuir para esse aumento.
“O fator genético é primordial para o desenvolvimento da miopia, porém, alguns fatores ambientais, o aspecto socioeconômico, educacional, hábitos de vida, tudo isso pode contribuir, sim, para o desencadeamento e agravamento da miopia”, explica a médica oftalmologista Myrna Serapião.
O adolescente Matheus Silva descobriu que tem 1,25 grau de astigmatismo nos dois olhos e 0,75 de miopia no olho direito. Ele conta que usa aparelhos eletrônicos de 4 a 5 horas por dia.
O pai dele diz que os hábitos se acentuaram na pandemia, já que a escola forneceu tablet para o aprendizado. “Aquele pouco período que ele tinha de manhã, que não ficava na tecnologia, ele acabou ficando quase dois anos fazendo aula online”, diz.
A Organização Mundial da Saúde prevê que em 2050 metade da população vai ter miopia. Segundo a médica, atividades ao ar livre podem ajudar a conter o avanço da miopia, já que a luz do sol tem um protetor contra a miopia.
E foi esse caminho que o Matheus decidiu seguir. Ele voltou para o grupo de escoteiros e passa mais tempo fora de casa. “Descobri que é até mais legal”, conta.
A busca pela cura
O mundo que a administradora Cíntia Couto vê tem cada vez mais borrões e a córnea que se projeta para fora dá um sinal de qual doença ela tem: o ceratocone.
“O ceratocone te dá muita coceira, então eu coço muito e isso acabou agravando com muito mais rapidez”, diz Cíntia.
Ela foi diagnosticada há pouco mais de um ano e soube que precisava de um transplante de córnea. Seis meses depois do diagnóstico, viu a notícia certa, na hora certa, de que um hospital de Sorocaba que fazia a fila andar mais rápido.
“Eu consegui entrar em contato com eles por e-mail e consegui dar entrada em todo esse processo, porque pelo Rio eu nem estava na fila ainda”, conta.
De olho nos olhinhos
Recuperar a visão ou evitar que ela seja prejudicada poderia ser muito mais fácil com o diagnóstico precoce, mas os brasileiros ainda carecem de informação e acesso. Um estudo feito pela Universidade Federal de Juiz de Fora mostrou que quase metade dos usuários do SUS não faz consultas periódicas com o oftalmologista.
E o diagnóstico na hora certa pode mesmo fazer muita diferença para continuar ou começar a vida. Esse é o caso da Julia, um bebê de apenas 8 meses diagnosticado com retinoblastoma.
O tumor se desenvolve na retina e representa 14% dos casos de câncer em menores de 2 anos. São cerca de 400 novos casos por ano no Brasil. É um câncer raro que ficou mais conhecido quando os jornalistas Tiago Leifert e Daiana Garbin contaram a história da filha, Lua, e iniciaram uma grande campanha de informação.
Ela é tratada no GRAAC, o Grupo de Apoio ao Adolescente e à Crianças com Câncer, em São Paulo, que atende principalmente pelo SUS e é referência no tratamento do retinoblastoma.
“A gente é capaz não somente preservar a vida da criança, mas a visão. Mas, para que isso seja feito, a gente precisa do diagnóstico precoce. Primeiro, o exame do olhinho, o teste do olhinho na maternidade, e segundo uma visita ao oftalmologidsta nesse primeiro ano de vida”, diz Monica Cypriano, diretora clínica do GRAAC.
Inteligência artificial amiga dos olhos
A retinopatia diabética é outra doença que atinge os olhos e pode levar à cegueira irreversível. É uma doença que geralmente não tem sintomas na fase inicial e se torna uma ameaça silenciosa para quase 17 milhões de pessoas que sofrem de diabetes, como a engenheira civil Danierick Daneon.
Para ela, o susto chegou aos 23 anos e a retinopatia desenvolveu o glaucoma. “O meu olho direito vê tudo, que nem uma pessoa normal. O esquerdo é como se eu tivesse olhando através de um box de banheiro embaçado com vapor”, conta.
Quanto mais cedo vier o diagnóstico, maiores as chances de preservar a visão. No entanto, na rede pública nem todo mundo consegue chegar a um oftalmologista a tempo. E é aí que a tecnologia pode fazer a diferença.
“Nós desenvolvemos tanto aparelhos que possibilitam fazer o que a gente chama de telemedicina, quanto à inteligência artificial para tentar encurtar o tempo em que o paciente tenha, desde o diagnóstico de uma doença como diabetes, até que ele chegue num serviço especializado”, explica o chefe do setor de retina da Unifesp, Caio Regatieri.
Um celular acoplado numa câmera com uma super lente que pode ir até os pacientes. Um programa de computador que analisa a foto da retina e já dá o primeiro alerta para o médico.
Em busca de um milagre
A cuidadora Jojana Infante tem uma dessas histórias de vida que dariam um filme de superação. Quando trabalhava como vendedora ambulante em uma manifestação na Venezuela, jogaram ácido nos seus olhos e ela ficou cega.
Foi em busca de um “milagre” que ela cruzou a fronteira com o Brasil. Passou por um desafio atrás do outro até chegar a São Paulo e finalmente ouvir do médico uma boa notícia.
“Não vou te dar esperança, mas vou fazer tudo o que está em minhas mãos para você pelo menos enxergar um pouco”, relembrou Jojana.
Ela recebeu uma prótese desenvolvida pelos pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo e ainda em fase de testes. A ceratoprótese é usada nos casos em que os transplantes de córnea não são mais indicados. O modelo desenvolvido pela Unifesp é composto por materiais modernos biocompatíveis, que já são estudados em outras áreas da medicina.
A melhora da visão veio rápido para Jojana. Poucas horas depois da cirurgia, ela já pôde tirar o curativo e ver, depois de 10 anos, o rosto do filho.
Fonte: G1 Globo